terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Quem foi Paulo Sergio Rouanet

Com a substituição de Ipojuca Pontes por Sérgio Paulo Rouanet, tem início uma
tentativa de recuperação da credibilidade de Fernando  Collor de Mello junto às
camadas intelectual e artística. O novo secretário de cultura, embaixador de carreira,
deixou sua gestão conhecida pela elaboração de uma nova lei de incentivos fiscais à
cultura (lei 8.313/1992), para ocupar o lugar  da anterior, revogada em março de
1990.
Embora o trabalho de regulamentação que tenha feito essa nova lei efetivamente
operacional e atrativa tenha  ficado para a gestão seguinte, do tributarista
Nascimento e Silva, o restabelecimento de um instrumento de incentivo fiscal era
algo esperado pelas clientelas de artistas e produtores culturais.  
Na década de 90 a grande tônica da administração cultural no Brasil, ao menos o
assunto que ocupa a maior parte do noticiário relativo à gestão cultural, é a questão
da parceria público-privado, que o governo federal vem buscando propor como a
melhor maneira de envolver empresas e pessoas físicas no financiamento a
atividades culturais. Neste sentido, o que se discute e se publica na imprensa a  
  
respeito de política  cultural, é quase só sobre esse assunto. Como diz Isaura
Botelho, "a prática vem demonstrando  que parte importante do cotidiano do
ministério se alimenta da  administração das exigências burocráticas das leis de
benefícios fiscais  e dos recursos que advêm do Fundo Nacional de Cultura,
(composto de porcentagem de loterias e de fundos regionais)".
Embora o esforço no sentido de tornar as leis atuantes e eficientes seja válido, na
medida em que significa diversificação de fontes de apoio, aumentando as
possibilidades de  viabilização de projetos que correspondam a uma pauta criativa
mais diversificada, dois riscos precisam ser considerados: o primeiro está em
imaginar que os financiamentos através de incentivos  fiscais possam substituir o
apoio direto a projetos (a fundo perdido); o segundo é o de permitir que a celebração
dessa nova "parceria" ajude na dissimulação de uma  intervenção casuística do
governo federal no plano da cultura.
Segundo Isaura Botelho "...a área de cultura requer a presença do setor
governamental através de uma política criteriosa que se veja refletida no sistema de
instituições que compõem o ministério.  O apoio financeiro  por parte do poder
público (...) reveste-se de um caráter, por assim dizer, pedagógico, com relação aos
demais segmentos da sociedade. Além de dar suporte a atividades de médio e longo
prazos que, por suas características, não dão retorno de imagem, a esfera
governamental é a única que pode encarar o setor de maneira global, contribuindo
para a existência de ações coordenadas que ataquem as inúmeras carências
existentes. Desta forma sua presença não só estimula a própria produção artística e
cultural, como também a valoriza perante aqueles que prioritariamente investem em
arte por razões de imagem e não por seu valor intrínseco".
Em fins de 1998, quando se colocou  a possibilidade de reeleição do presidente
Fernando Henrique Cardoso, e, por conseguinte, a de recondução  do ministro
Francisco Weffort, o Ministério da Cultura editou uma coleção de textos - Um olhar  
  
sobre a cultura brasileira, organizada pelo próprio ministro e pelo diretor da
Funarte, Márcio Souza.  
Os textos reunidos no  volume, escritos na  quase totalidade por altos dirigentes do
ministério, além do objetivo óbvio de mostrar  o que fora feito nos quatro anos da
gestão que, em princípio, estaria acabando, tem duas virtudes  que merecem
destaque: a primeira é o fato de reunir em um só volume uma paisagem das mais
variadas áreas da cultura brasileira, abordadas de perspectiva crítica, e na maioria
das vezes referida à ação da administração federal; a  segunda é a de não esconder
algumas das grandes carências ou atrasos do país em matéria de artes e patrimônio
artístico e histórico.  Entre essas carências ou problemas eu destaco três: o déficit de
leitura; a degradação física e subutilização do patrimônio histórico; o encarecimento
da temporada de ópera. A razão é que elas, a meu ver, abrem questões centrais de
gestão cultural.
A insuficiência ou déficit de leitura entre brasileiros. Ela aparece mensurada através
do índice de 2,4 livros produzidos por habitante/ano, enquanto na França é 7 e nos
Estados Unidos, 11. Retirando-se do total produzido os livros didáticos, em geral de
leitura obrigatória e distribuição gratuita, o déficit se mostra ainda pior:  0,8 livros
per capita/ano, estimado para o ano corrente de 2000. (p.42/3).
Entre as causas múltiplas, mas bem conhecidas, do problema, estão a escassez de
canais de distribuição (26 mil bancas de jornais e menos de mil livrarias, "a maioria
em dificuldades"). As tiragens insuficientes (3.000 exemplares no Brasil, contra
30.000 em países adiantados, encarecendo o preço final). "O livro livremente
comprado pelos cidadãos é  um mercado que não se desenvolve", diz o texto,
salientando o conhecido estrangulamento dos canais de distribuição, além do custo
final, que deixa o preço médio final do livro equivalente a um décimo do salário
mínimo.  
  
As compras de livros por parte de bibliotecas públicas são  quase nulas". Essas
bibliotecas são 3.896, na  grande maioria municipais, das quais 356 (ou 9,1%)
possuem computador e 2.500 (64%) não possuem sequer uma copiadora, segundo
pesquisa recente feita pelo minC. As estimativas de um número razoável para o
Brasil são da ordem de 10 a 15 mil bibliotecas públicas, para atingir um nível como
o da Espanha ou da Itália. (p.43).
A análise do setor editorial encaminha-se para justificar o Programa "Uma
biblioteca em cada município", no qual o minC repassa a prefeituras ou estados uma
verba de até 40 mil reais,  destinados à compra de 2000 volumes para iniciar um
acervo, podendo parte da verba  cobrir itens como estantes, mobiliário e afins. A
construção do prédio, o telefone, o salário da bibliotecária,  são por conta da
prefeitura ou estado.
Quanto ao desgaste físico do patrimônio histórico e artístico, a estatística é
alarmante:  "Segundo dados do IPHAN, cerca de 50% dos imóveis históricos sob
tutela federal encontram-se degradados e 25% estão exigindo alguma obra de
recuperação". Logo a seguir acrescenta-se que aproximadamente dois terços desses
imóveis encontram-se abandonados ou subutilizados". Estimativa de custo é de um
bilhão de dólares para recuperação e 50 milhões anuais para manutenção. (p.147).
O terceiro aspecto, o encarecimento do  custo de uma temporada de ópera, aparece
dentro de um discurso que lastima o declínio dessas apresentações no Brasil, quando
comparado com a situação prevalecente até os anos sessenta. Naquela época  "...os
teatros municipais do Rio de Janeiro e São Paulo apresentavam regularmente
temporadas com quatro a cinco produções. A qualidade das produções variava de
ano para ano, mas o público era fiel. O custo das temporadas era absorvido em parte
pelos poderes municipais e estaduais, mas os empresários investiam nas produções,
especialmente nas co-produções ou nas importações de cenários, figurinos, cantores
líricos e maestros. O custo dessas temporadas era realista, e a soma da bilheteria e a
ajuda oficial amortizava os investimentos.  Na década de 1970, essa economia   33/112
  
modesta e rotineira é varrida de cena. A ópera, no Brasil, passa a ser superprodução,
a exigir investimentos de mais de 3 milhões de dólares em cada montagem, um salto
inflacionário brutal para os antigos 100 mil dólares por montagem das temporadas
do passado. Com essa inflação de custos o público fiel desse gênero se viu alijado
dos teatros municipais pelos ingressos dispendiosos". (pp.212/ 214).
Pela sua característica única de ser uma publicação abrangente e capaz de fazer o
balanço, quando menos dar uma idéia geral da situação de cada gênero artístico no
Brasil, contrastando seu estado atual com o desejável, e propondo quais
instrumentos de política cultural poderiam reduzir tanta  distância, seria de esperar
que o livro de Weffort e Souza fosse objeto de muita atenção e debate nos meios
artísticos e acadêmicos
6
 Além dos estudos e observações de tendências .
quantitativas proporcionados pela existência de leis de incentivo fiscal à cultura
(que compõem, aliás, os dois últimos capítulos do livro de Weffort e Souza, cabe
mencionar o estudo que o minC encomendou à Fundação João  Pinheiro, de Belo
Horizonte, e que se encontra disponível no seu site.
A Fundação João Pinheiro, de Belo Horizonte, já tinha uma experiência prévia de
um primeiro e preliminar estudo de economia da cultura, divulgado em uma época
em que muito pouca gente, inclusive e sobretudo economistas, se interessaria pelo
assunto. O segundo estudo - Pesquisa de  Economia da Cultura -  traz dados mais
sistemáticos; acompanha as tendências do  dispêndio governamental no período
1986 a 1995. Quanto aos gastos federais, mostra como os gastos declinam no
período de Collor para depois se recuperar. E que  os dispêndios estaduais e
municipais (considerados apenas os 27 municípios que são capitais de estados) têm
uma tendência inversa, como que "substituindo o governo federal" quando os gastos
destes declinam. De todo o modo, a constatação de que os gastos governamentais
                                            
6
 Lamentavelmente, porém, a única repercussão do livro até esta data (maio de 2000) parece ser a acusação, pela
imprensa, de ele ter tido um  custo de produção editorial abusivo. Sem dúvida, a opção editorial por um formato
artístico transformou o resultado final em algo mais para ser visto do que lido, como o são os livros de arte de modo
geral.  
  
em cultura são de 5 reais per capita/ano, é pouco encorajadora. Considerando-se que
somente um terço dos  municípios/capitais-estaduais gastam quase 90% do total,
tem-se uma idéia clara da enorme concentração que isso significa. No que se refere
às leis de incentivo, a pesquisa mostra que as duas leis federais juntas financiam
mais de quatro quintos de todos os projetos culturais, cabendo o restante a 12 leis
estaduais e 17 municipais.
O estudo em questão foi bastante divulgado pelo minC, em uma época em que os
seminários e as publicações interessadas em marketing cultural se expandiam
rapidamente. Os dois pontos em que se insistiu muito na divulgação foram:
primeiro, o poder de criação de empregos na área cultural, que seria 16 vezes
superior ao investimento na indústria de transformação, para a mesma massa de
investimento. Em uma época de retração da capacidade de geração de emprego na
economia brasileira em seu todo, a notícia ganhou particular interesse;  segundo, o
sucesso das leis de incentivo fiscal à cultura em sua capacidade de atrair um número
crescente de empresas.    
É preciso frisar que o estudo da Fundação João Pinheiro foi divulgado apenas em
uma versão que sintetiza os principais resultados, não tendo havido, ao que se saiba,
uma exposição e discussão mais aprofundada de sua metodologia. De todo o modo,
ele reúne as estatísticas  de dispêndio público que até então eram fragmentárias,
assim como pela primeira vez dimensiona o setor cultural como parte da economia
brasileira. Ou seja, um setor que ocupa 510 mil pessoas (três quartos das quais na
área privada dos mercados culturais) e que representa 1% do produto interno bruto:
6,5 bilhões de reais. O estudo mostra que saúde não ocupa mais de 2,2% e educação
3,1% da força de trabalho, o que salienta, por aproximação e diferença,  a
importância econômica da cultura. Um outro estudo encomendado pelo minC
analisou a estrutura econômica  da indústria de cinema no Brasil e  sua inserção no
mercado áudiovisual internacional.

 Ver, no site do minC, A Economia do Cinema no Brasil, clicando-se em Economia da Cultura.  
  
Durante os anos noventa também ocorreram  outras iniciativas de quantificação na
área cultural brasileira, indispensáveis para uma visão mais orgânica do setor. São
levantamentos, mapeamentos e cadastros executados  por órgãos públicos, por
universidades, por organizações não governamentais ou mesmo  por pesquisadores
autônomos. São trabalhos puramente documentais, que não rendem na mídia, mas
que são indispensáveis, sobretudo porque juntam muita  informação e comprovam a
existência, no país, de uma rede cada vez mais densa de artistas, produtores
culturais, grupos, instituições, equipamentos, fontes de recurso, etc. Uma visão nova
e mais otimista da vida cultural brasileira  se torna assim possível,  na medida em
que essa massa documental tenha condições de atualização e disponibilização,
ajudando a desacreditar a postura cética que se alimenta da desinformação, mas que
insiste em acreditar que o  campo cultural brasileiro continua sendo um abismal
vazio.  Servem aqui de exemplos iniciativas como   os censos culturais já realizados
para os Estados de São Paulo (pela Secretaria Estadual de Cultura de SP, que
também organizou o Mapa Cultural Paulista), de Minas Gerais  e Bahia (realizados
pelo escritório Informações  Culturais, de São Paulo). Tais censos inventariaram
todos os espaços e equipamentos culturais disponíveis. Outro exemplo é o "capítulo
Brasil" que o Centro de  Estudos da Cultura e do Consumo, da EAESP/FGV,
organizou para a Organização dos Estados Iberoamericanos, com sede em Madri,
juntando e organizando informações sobre instâncias governamentais, não
governamentais e privadas  com ação na área cultural,  associações de artistas e
técnicos, de arrecadação de direitos autorais, cadastros de artistas das mais variadas
especialidades. O minC organizou um Censo de Oferta Cultural, em 1988, do qual
uma parte está disponível em seu site. Ele organiza também um Cadastro de Eventos
Culturais, por município, e disponibiliza em seu site o Sistema Aberto de Cultura e
Informação/SACI, que é um conglomerado dos mais diversos  acervos.  O enorme
avanço da informática na última década tem ajudado muito nesse esforço, cujo
resultado se verá melhor quando emergir - espera-se - uma demanda
(governamental, associativa, empresarial  e acadêmica) por estudos e serviços que
exijam uma visão mais completa, precisa e orgânica da área.     36/112
  
Por força dos interesses que se organizaram em torno das leis de incentivo fiscal, de
sua operacionalidade e  de seu interesse na  estratégia empresarial, os anos noventa
também foram pródigos em debates que reuniram artistas, produtores culturais,
técnicos do setor público e  gerentes de marketing. Embora oportuna, a
transformação desses debates em livros (Mendonça, Marcos, 1994; Mendes de
Almeida, C., Informações Culturais, 1998) não chegou a  suprir a falta de estudos
mais sistemáticos, inclusive de um bom manual de marketing, que, aliás, só pode ser
construído em cima do conhecimento da estrutura e do volume de cada um dos
mercados culturais, o que  supõe, por sua vez, uma quantidade e diversidade de
informações que ou não existem no Brasil, ou são de domínio privado das
organizações que os produzem ou os compram  (Colbert, 1997).
O Primeiro Fórum de Integração Cultural "Arte sem Fronteiras" aconteceu em
novembro de 1998, em S.  Paulo, e reuniu dirigentes e técnicos de inúmeras
agências, além dos adidos culturais dos países da região. Teve patrocínio do Sesc e
da Unesco e seu temário girou basicamente em torno das condições e possibilidades
de integração cultural no continente, como condição de reforço de identidades
culturais e de consolidação democrática. Entre as propostas desse evento destacouse a necessidade e a urgência de circulação de mais e melhores informações sobre a
vida cultural e sobre os seus suportes econômicos, legais, políticos e
administrativos, em cada país do continente.
Um tema final, em conexão com as mudanças mais recentes no cenário das políticas
culturais (inclusive presente no Fórum acima citado) e exacerbado pela
globalização, é o da relação entre política cultural e diplomacia.
Apesar de o Brasil ter uma diplomacia  muito prestigiada internacionalmente, os
diplomatas brasileiros muito pouco avançaram em uma reflexão sobre a dimensão
cultural nas relações internacionais.  Existe apenas uma monografia publicada por
diplomata brasileiro sobre o assunto (Ribeiro, 1989).  Segundo o autor, buscando
uma delimitação inicial, o universo da  diplomacia cultural recobre as seguintes  
  
atividades: intercâmbio de pessoas; promoção da arte e dos artistas; ensino de
língua, como veículo de valores; distribuição integrada  de material de divulgação;
apoio a projetos de cooperação intelectual; apoio a projetos de cooperação técnica;
integração e mutualidade na programação (p.21).
É uma obra felizmente rica em  material para situar os  principais momentos de
integração da cultura nas relações internacionais dos países mais poderosos no
século XX. Ela serve de base principal aos comentários que seguem.
Considerem-se de início os países europeus que se projetaram internacionalmente a
partir dos séculos XVIII e XIX como metrópoles coloniais. Eles construíram, desde
o início do séc. XX, (mas com forte avanço imediatamente antes e durante a
segunda guerra mundial) redes institucionais para difusão e imposição de seu
idioma e de sua tradição artística, como é o caso da França
, da Inglaterra

 da Alemanha
, concentrando recursos  segundo prioridades ditadas por suas diretrizes
de política externa (Ribeiro, 1989; Ministère des Affaires Etrangères (França), 1984
e 1995).
                                            
 Em final dos anos oitenta a França administrava uma rede com mais de 100 liceus, 250 centros ou institutos
culturais e 1.200 filiais da Aliança Francesa, com aproximadamente 500.000 estudantes matriculados. A partir da
descolonização, o francês passou a ser o traço comum de mais de 140 milhões de pessoas em 32 países
independentes. O Ministère des Affaires Etrangères, através da Direção Geral para as Relações Culturais,
Científicas e Técnicas, hoje coordena a política cultural externa da França, orquestrando a repercussão no exterior
das atividades da Radio France Internationale, Instituto Nacional do Audiovisual, entre outros. (Ribeiro, 1989,
pp.54 e 55).
9
 O British Council começou a atuar culturalmente em 1934.  Suas atividades vão "desde o ensino da língua e a
formação de professores de inglês, ao intercâmbio acadêmico e profissional no campo da ciência, das artes e da
tecnologia. A entidade organiza, além disso, concertos, exposições de artes plásticas, feiras de livros e mostras
teatrais. A BBC e o Central Office of Information também fazem parte do sistema de informação. O Foreign Office
acompanha a programação da BBC.(Ribeiro, 1989, p.60)
10
 A partir dos anos sessenta a República Federal da Alemanha incluiu cultura em sua  estratégia internacional,
visando remover o estigma deixado pelo nazismo e recuperar seu prestígio. Ribeiro enumera o enorme avanço
conseguido através do trabalho de vários organismos federais de informação e cultura que atuam na área
internacional. Por exemplo,  o Instituto Goethe, com aproximadamente 170 centros de estudo espalhados por
sessenta e cinco países. A Direção de Relações Culturais do Ministério dos Negócios Estrangeiros tem a
coordenação do sistema.    
  
O uso da cultura como dimensão da política internacional, no caso dos Estados
Unidos,  também teve a ver com a Segunda Guerra Mundial, com a criação de uma
Divisão de Relações Culturais no Departamento de Estado. "Também em função da
segunda grande guerra, a América Latina viria a ser o primeiro continente a receber
institutos culturais norte-americanos.  A exemplo do ocorrido com os centros
ingleses, franceses e italianos, esses institutos, que haviam originalmente surgido de
forma mais ou menos espontânea graças ao esforço das comunidades de americanos
residentes na América Latina, logo passaram a receber apoio financeiro e logístico
do governo norte-americano. Em 1946 já havia 27 desses  institutos culturais em
todo o mundo, a maior parte deles na América Latina". (Ribeiro, 1989, p.62; ver
também Moura, 1984).
Em 1953 o governo  norte-americano cria a USIA/United States Information
Agency, e com ela inicia-se o declínio da influência do Departamento de Estado em
matéria de planejamento e controle das atividades culturais e de informação norteamericanas no exterior.  Mas, de modo geral, segundo Ribeiro, seja pela conjuntura
da guerra, seja depois pelo confronto ideológico com a União Soviética, as
atividades culturais da política externa americana nunca perderam completamente
algum caráter de propaganda.
Ribeiro sustenta que o Brasil precisa desenvolver  a uma ação diplomática mais
consistente e desejável em matéria de cultura; uma ação planejada e devidamente
fundamentada no princípio de  mutualidade, ou de igualdade reconhecida entre
parceiros, e sobretudo fundada em uma visão de longo prazo (visto que a ansiedade
por efeitos mais rápidos denuncia uma  intenção propagandística, reduzindo sua
própria eficácia). (p.71).
Por outro lado, as programações culturais a serem feitas com o apoio da diplomacia
deveriam ouvir "as reais necessidades dos países de destino", ou seja "os artistas e
intelectuais do país-alvo das programações deveriam ser consultados". (p.91)   39/112
  
Ribeiro se mostra  entusiasmado com o acordo então recente entre Itamaraty, minC
e MEC, e também com a recente criação do minC abrindo a  possibilidade de,
internamente, o governo federal começar a agir com estratégia. Também acreditava
na possibilidade de criação  de uma linha de incentivos fiscais para alimentar um
Fundo para a Promoção da Cultura no Exterior.11
 Quanto à ação passada, lembra o
papel importante da diplomacia brasileira em articular a divulgação e a
comercialização do cinema brasileiro no exterior, em convênio com a Embrafilme,
assim como uma série de outras iniciativas de apresentação da arte brasileira em
outros países das quais teria resultado um efeito positivo de alavancagem.
Apesar desses fatos encorajadores, o diplomata previu em seu livro um cenário
"lento e sinuoso" para a diplomacia cultural brasileira. Enfatizou que só com uma
ação menos casuística e passiva

 o Brasil conseguiria  edificar uma diplomacia
cultural compatível com "a parcela de  influência que lhe cabe no cenário
internacional". (p.101).  Certamente, a sinuosidade e a lentidão foram sua maneira
de imaginar o quanto se teria de caminhar até começar a reverter uma situação
orçamentária muitíssimo desfavorável, como a descrita nesta comparação:
"...a faixa média das despesas de alguns países desenvolvidos com projetos de
difusão cultural e assistência técnica, no período 1986/7, teria sido
aproximadamente a seguinte: França, 1,2 bilhão de  dólares; RFA, 996 milhões;
Japão (...) 510 milhões; e Grã-Bretanha, 370 milhões. O Brasil, em comparação, não
gastaria, de momento, mais  do que 1 (um) milhão de dólares com projetos nessas
áreas". (p.71).
Paulo Sergio Rouanet

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